5/31/2007

Quadro Dinâmico


Abandonando a sala de cinema ao fim de quase três horas de filme, fico com a sensação de ter visto uma obra de arte estranhamente completa e abstracta.
É verdade que o cinema joga com a imagem, a música e o movimento. Mas Inland Empire é mais do que isso. A forma de jogar com aqueles elementos é única, formando o verdadeiro mundo surrealista "lynchiano".
Não tenho qualquer pretensão de tentar explicar o filme. Não sei ainda quem tenha encontrado uma explicação convincente (nem conheço muitas pessoas que tentem).
A minha forma de olhar este filme é completamente diferente. Longe de esperar um enredo que se revele ao longo do filme ou o desmistificar de um grande mistério no final, encaro este filme como um grande e delicioso banquete para os sentidos e para a mente. Laura Dern, fotografia e música num ambiente negro e misterioso. Olhado deste ângulo não podia estar melhor!
Ao contrário do que se possa pensar, Inland Empire não é desprovido de sentido, muito pelo contrário. Tem o sentido do surrealismo puro e onírico da mente perturbada de uma mulher. Aqui, como em outros filmes de David Lynch ("Mulholland Drive", "Os últimos Sete Dias de Laura Palmer") a mulher personifica os traços mais obscuros e perturbantes da mente humana. Através da mulher Lynch faz cair todas as máscaras humanas e confronta-nos com os nossos piores medos, as frustrações mais recalcadas, as demências e fraquezas que jamais ousaríamos admitir.
Segundo o próprio Lynch, Inland Empire é um filme que nasce de uma ideia (começou com a ideia do monólogo de Laura Dern no cimo das escadas), neste caso uma das fases mais "dementes e imperceptíveis" do filme. As outras ideias nascem depois, uma e outra e muitas outras.
Temos assim, muito sucintamente, um filme dentro de um filme onde a determinada altura deixamos de perceber se estamos no filme principal ou no filme sobre o filme. A personagem de Laura Dern também se confunde com a personagem que interpreta no filme, deixamos de saber quem é quem. Finalmente a história, a ficção mistura-se com a realidade num conjunto de devaneios que são perceptíveis apenas quando isolados do resto do filme. O conjunto não tem qualquer sentido lógico e é aí que está a beleza de Inland Empire. Tudo aquilo não foi feito ao acaso, é produto de uma grande imaginação e um maior sentido estético. Inland Empire é de uma beleza imagética do início ao fim. Tudo isto numa mistura perfeita de música e interpretação.
Sem dúvida um dos mais arrojados filmes de David Lynch cuja apreciação depende de uma predisposição para a contemplação pura.

1 comentários:

Pita disse...

Não deixas de ter razão em alguns pontos, mas começo a deixar de ter pachorra para os universos redundantes e dementes do Lynch.
Atingiu o pico com Mulholland Drive. Com Inland Empire a fasquia começa a descer.
Opinião, claro está.
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