10/10/2013

O PRÍNCIPE

A entrada da casa fazia-se através de um alçapão no teto. O barulho ensurdecedor de milhares de gotas enchia o compartimento estreito e escuro, cujas escadas conduziam à porta enferrujada. Sem saber bem o que esperar, ela agarra o manípulo e empurra o retangulo de metal para cima. Instintivamente fecha os olhos e sustêm a respiração enquanto a água gelada acumulada do lado de lá encharca-lhe o corpo e penetra-lhe nos olhos e narinas. Terminado o dilúvio, um grito mudo segue-se de um arrepio e o estrondo da laje de metal empurrada ecoa no edifício.

Erguendo-se do buraco, encontra-se agora naquilo que parece ser uma caverna, húmida, escura, forrada de veludo púrpura. Apesar do ambiente desconfortável, ela está contente por saber que aqui vai disfrutar de alguns dias de descanso. Por sua vez, ajuda a outra a subir também para o quarto de entrada, misteriosamente seco, e onde já se podiam vislumbrar duas camas prontas a acolhê-las.

Enquanto elas desfazem as malas e experimentam as camas, o observador deita-se no chão e verfica que apesar da carpete aveludada e felpuda, o chão irregular do quarto é desconfortável e questiona-se acerca da felicidade de ambas em permanecer naquele sítio em tudo grotesco.

Ele acompanha-as como uma sombra através dos quartos adjacentes até que decidem repousar naquilo que parecem ser sacos-cama castanhos, pendurados do teto como casulos.

Ao despertar, a outra chama por ela. Na ausência de resposta, procura-a entre as faixas de tecido acetinado e encontra-a tremendo, encolhida, de olhos abertos horrorizados.

Ao observador é-lhe apresentada uma paisagem citadina -- um fim de tarde solarengo e doirado. Sem que nada o denunciasse, uma vaga de nuvens cinzentas vindas de norte escurece as ruas e as pessoas. Segue-se uma nuvem mais preta do que as outras, descarregando um raio violento sobre os edifícios no horizonte. Uma explosão, gritos e o princípio do caos. A nuvem transforma-se numa forma bípede gigantesca, semi-humana, que corre em direção ao observador, destruindo tudo à sua passagem.

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